Agapan comemora 50 anos da subida na árvore
Um gesto ousado e corajoso transformou-se em um marco da luta ambiental no Brasil e ganhou as páginas da mídia internacional

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No dia 25 de fevereiro de 1975 um participante de reuniões da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), o estudante de Engenharia Mecânica da UFRGS Carlos Alberto Dayrell (que mais tarde se tornaria agrônomo) não teve dúvidas em pegar uma escada emprestada de um gari e subir numa Tipuana que seria a próxima árvore cortada para a construção de um viaduto, em Porto Alegre.
Também subiram na árvore Marcos Saraçol, seu colega de moradia na Casa do Estudante, e a universitária Teresa Jardim. Esse gesto quase impensado rendeu a solidariedade de quem acompanhou o ato e uma repercussão pela mídia em escala global, incluindo a Revista Times, tornando aquele momento um símbolo de resistência e de uma nova consciência ambiental.
Em pleno período de ditadura militar, o ato dos jovens exigiu diálogo e negociação com autoridades municipais e militares. Dadas as garantias de que não seriam presos e de que a árvore seria preservada, os estudantes desceram, mas acabaram todos fichados no Dops, órgão do governo brasileiro que atuou na repressão de movimentos sociais e populares. Toda a negociação foi acompanhada de perto pelos ambientalistas da Agapan, entre eles, os icônicos Caio Lustosa, José Lutzenberger e Augusto Carneiro. A partir de então, o movimento ambientalista também entraria na lista de “subversivos” da ditadura militar brasileira.
Os desdobramentos do episódio fizeram com que o então prefeito da cidade, Telmo Tompson Flores, voltasse atrás e preservasse essa e outras árvores, que ainda resistem no local em 2025, apesar do trânsito intenso e da poluição de uma das vias mais movimentadas da capital gaúcha - a avenida João Pessoa, bem no centro de Porto Alegre.
No dia 25 de fevereiro, data que marcou os 50 anos do ato, um grupo de ambientalistas se reuniu em torno da Tipuana para homenagear o feito. Marcos Saraçol estava presente ao ato, mas Carlos Dayrell não pode estar presente. Atualmente ele vive em Montes Claros, Minas Gerais, onde atua como agrônomo.
Mas Dayrell confirmou que virá a Porto Alegre a Convite da Agapan no dia 25 de abril para comemorar os “50 anos da subida na árvore” e os 54 anos da entidade, fundada em 1971 e atuante até hoje de forma cem por cento voluntária.
Toda a comunidade está convidada para o ato simbólico que acontece no dia 25, às 13h30 junto à Tipuana, em frente a Faculdade de Direito da UFRGS, em Porto Alegre. No dia, 26, em frente à banca da Agapan, na Feira dos Agricultores Ecologistas, às 10h30, acontece uma roda de conversa – Resistir para Existir e Respirar - e à noite uma confraternização. Informe-se pelo Instagram.
História e depoimentos
"Manter vivo na memória da população esse gesto de proteção ambiental é uma tarefa que a nossa entidade carrega consigo desde 1975 e levará para as próximas gerações como um legado de esperança e fé nas conquistas da luta ambiental. Só a consciência ecológica plena tem condições de reverter esse rumo ecocida que está sendo imposto pelo atual modelo de consumismo global", Heverton Lacerda, presidente da Agapan.
"Devemos preservar a memória desse gesto como um exemplar de um valor simbólico imenso para a defesa da natureza e a nossa própria sobrevivência como espécie, que hoje está ameaçada por nós mesmos, pela nossa própria atitude diante da natureza", Celso Marques, ex-presidente da Agapan.
"O ambientalismo se faz com as mãos, com a presença. A virtualidade é uma distorção antiambiental, é um outro mundo que não é o mundo do ambiente, é o mundo do ambiente virtual e, por isso, tem muito pouco poder. Eu acho que a gente tem que evoluir e tem que dominar, porque o poder econômico tá sendo muito mais rápido, muito mais eficaz em dominar as inovações, as redes sociais, tudo. O que aproxima é o conhecimento. Então é esse o desafio atual", Francisco Milanez, diretor Científico e Técnico da Agapan e ex-presidente da entidade.
Foto: Bruna Suptit - Sindjor
No ano de 1976 seria criada a Secretaria do Meio Ambiente de Porto Alegre, a primeira do Brasil em âmbito municipal. Muito tempo depois, em 2013, ativistas de outra geração repetiriam a atitude de Dayrell durante os protestos contra a derrubada de árvores na Orla do Guaíba.
Em 1998, foi inaugurada uma placa de bronze em reconhecimento ao salvador da Tipuana no pátio da Faculdade de Direito. Ainda naquele ano, ele recebeu o título de Cidadão Honorário de Porto Alegre. “Ainda que os desafios, hoje em dia, sejam muito maiores, em comparação aos da década de 1970, continuo acreditando que a vida deva ser colocada, sempre, em primeiro lugar”, disse Dayrell ao receber o título de cidadão da cidade.
*Com informações do Sindicato dos Jornalistas de Porto Alegre e da Agapan. Saiba mais aqui.
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