6 recomendações para evitar o vício em jogos de aposta
Alta no número de usuários exige providências urgentes e já está se tornando uma questão de saúde pública

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Cerca de 10,9 milhões de pessoas no Brasil já apresentam sintomas de dependência em jogos de aposta, com maior prevalência entre os adolescentes e pessoas de baixa renda, segundo Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), da Unifesp, divulgado recentemente pelo Observatório Brasileiro de Informação sobre Drogas, do Ministério da Justiça.
Com o objetivo de fomentar iniciativas fundamentadas em evidências científicas para enfrentar esse novo desafio de saúde pública relativo ao vício em jogos de apostas (Bets), a equipe do Levantamento Nacional de Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo, em colaboração com pesquisadores do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), elaborou um conjunto de recomendações.
A abordagem adotada está em consonância com estratégias internacionais reconhecidas por sua efetividade e baseadas nas melhores evidências científicas disponíveis até o momento.
1- Regulamentação e Supervisão
- Implementar requisitos mais rigorosos de licenciamento para operadores de jogos de azar online, assegurando transparência e responsabilização na oferta desses serviços (Dash et al., 2024).
- Assegurar que órgãos regulatórios independentes tenham autoridade para fiscalizar o setor, monitorar práticas comerciais e, principalmente, sejam capazes de aplicar sanções quando necessário (Dash et al.,2024; Wardle et al.,2024).
2 - Proteção de Crianças e Adolescentes
- Proteção mandatória de crianças e adolescentes para as apostas, aplicando rigorosamente os requisitos de idade mínima, respaldados por identificação obrigatória (Wardle et al.,2024).
- Modernizar sistemas de cadastro e monitoramento, incorporando estratégias como: Verificação de identidade biométrica, analise de comportamento e padrões de uso (behavioral analytics), verificação de documentos com inteligência artificial ou autenticação com selfie (sistemas de KYC reforçados), implementar limites técnicos e de perfil (soft blocks), entre outros métodos.
- Integrar conteúdos educativos nas escolas sobre os riscos associados aos jogos de azar e estratégias de resistência a influências sociais e midiáticas.
- Reduzir a exposição de menores de idade aos jogos de azar, proibindo ou restringindo o acesso, a promoção, o marketing e o patrocínio em canais acessíveis a esse público (Wardle et al., 2024).
OBS - O marco regulatório das apostas (Lei nº 14.790/2023) do Brasil ainda não definiu diretrizes específicas de propaganda.
3 - Proteção aos Grupos Vulneráveis
- Implementar registros obrigatórios de usuários para possibilitar rastreamento de padrões de uso e intervenções precoces.
- Criar sistemas universais de autoexclusão, permitindo que indivíduos limitem voluntariamente seu acesso às plataformas de jogo (Wardle et al., 2024).
- Oferecer ferramentas tecnológicas de monitoramento, como alertas personalizados e bloqueios automáticos com base em comportamento de risco.
4 - Financiamento para pesquisa, educação e assistência
- Estabelecer contribuições obrigatórias dos operadores para um fundo público destinado a financiar pesquisas independentes sobre os impactos dos jogos de azar, campanhas educativas de amplo alcance e serviços de tratamento e apoio às pessoas afetadas (Dash et al., 2024).
5 - Mudança na Abordagem de Comunicação
- Substituir o discurso centrado no "jogo responsável", que transfere a responsabilidade exclusivamente ao indivíduo. Sugere-se que a resposta de saúde pública deve priorizar promover campanhas educativas baseadas em evidências para desnormalizar comportamentos de risco (Livingstone & Rintoul, 2020 ).
- Promover campanhas educativas baseadas em evidências com foco na desnormalização das apostas como forma de lazer aceitável, especialmente entre jovens e populações vulneráveis
- Exigir transparência nos riscos associados aos jogos, incluindo a probabilidade real de perdas financeiras e os mecanismos de manipulação utilizados pelas plataformas.
6 - Restrição à Publicidade de Apostas
- Proibir a publicidade de jogos de azar em mídias acessíveis a menores de idade e em horários de ampla audiência.
- Limitar o uso de figuras públicas, influenciadores e atletas na promoção de apostas.
- Obrigar a inclusão de alertas claros e visíveis sobre os riscos associados ao jogo, semelhantes aos utilizados em campanhas antitabaco.
Recomendações para apostadores*:
- Converse com alguém: Se você acha que as apostas podem estar se tornando um problema, busque ajuda. Falar com alguém fora da situação pode ajudar a encontrar soluções. Organizações como os Jogadores Anônimos (JA) ou Centro de Referência em Saúde Mental Álcool e Drogas oferecem suporte.
- Reflita sobre suas motivações para jogar: Identifique os motivos pelos quais você aposta. Apostar não deve ser um hábito compulsivo ou uma maneira de resolver problemas financeiros. Não use o jogo como estratégia para sair de dívidas ou ganhar dinheiro rapidamente.
- Monitore sua atividade de jogo: Acompanhe com que frequência e quanto dinheiro você está gastando.
- Busque Informação de Qualidade: Informe-se sobre os riscos reais das apostas, as probabilidades de perda e os mecanismos de manipulação empregados pelas plataformas. Conhecimento é uma ferramenta poderosa de proteção.
- Defina limites de gasto: Estabeleça um limite de quanto pode gastar em apostas.
- Faça pausas entre as apostas: Tire intervalos regulares para evitar sobrecarga e dependência. Bloqueios temporários em contas de jogo podem ser usados para manter clareza mental e controle financeiro.
- Proteja suas informações pessoais: Nunca compartilhe seus dados pessoais ou bancários com terceiros para abrir contas de jogos. Isso pode expô-lo a riscos como roubo de identidade, fraude ou até envolvimento em atividades criminosas
- Evite o Uso de Substâncias Durante o Jogo: Evite consumir álcool ou outras substâncias durante a prática de apostas, pois isso pode comprometer o julgamento e favorecer decisões impulsivas.
*Baseadas no United Kingdom Gambling Commission, 2021