Não temos cérebro para funcionar desta forma
Especialista orienta para curar o “cérebro pandêmico”
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Denise Tartarotti Postay*
Paradoxalmente nos tornamos mais conectados com as informações, mas nos desconectamos afetivamente. Inclusive desconectando o nosso olhar do outro.
As crianças e adolescentes que passaram pela pandemia em frente às telas ou que estão sendo filhos de pais superconectados com seus celulares/computadores, não estão mais praticando a qualidade da conexão com o olhar.
A gente vê até mães amamentando seus bebês com o celular na mão, não conectando mais sequer o seu olhar com o de seu bebê, que é o primeiro vínculo essencial para o ser humano ter uma saúde mental: a conexão da mãe com o filho, isto é, segurança básica.
Sempre que o bebê está sendo amamentado, procura o olhar da mãe. Sempre que ele está no colo vai procurar o olhar do adulto para que ele possa fazer o processo de conexão. Para o cérebro de uma criança, além de saúde mental, este processo significa uma estimulação neural. E a criança precisa desta estimulação para realizar o seu desenvolvimento psíquico, físico, emocional.
Mas isso tudo está sendo colocado em risco.
As reversões precisam ser instaladas. Reorientar o olhar para o que é essencial se faz urgente, rever o que ficou disfuncional é preciso. O ser humano só sobreviveu porque fortaleceu vínculos. Somos mamíferos que abraçam, acolhem, se ligam através do corpo, do olhar e da fala. Nunca vivemos antes através de uma conexão virtual. Não temos cérebro para funcionar dessa forma.
A experiência de proteção e de segurança é por contato e não virtual. Essa sensação básica de segurança fica debilitada nas redes sociais. Pertencer a grupos virtuais não nos sustenta afetivamente nem emocionalmente.
Um dos caminhos de volta para a saúde emocional e física é poder estimular vínculos que nos conectam presencialmente, afetivamente.
Tecnologias leves
Apesar desse estado de coisas, estamos numa era da existência em que o acesso a estudos de ponta, através da Neurociência, nos ajuda a entender esses processos.
A Neurociência transversaliza todas as áreas e mostra como o cérebro se comporta quando utilizamos as chamadas “tecnologias leves”, como a meditação, o mindfulness e as práticas de respiração consciente e como elas conseguem alcançar o cérebro primitivo, hoje hiperativado, regulando-o dentro dele mesmo. Porque nada regula o cérebro primitivo. É ele mesmo que se autorregula.
Essas “tecnologias leves” podem ser criadas no dia a dia, em pequenas práticas, como uma forma natural para criar essa autorregulação.
Somos responsáveis pelas novas gerações que estão vindo. Essas crianças, adolescentes e adultos jovens podem e devem aprender, dominar e integrar essa autorregulação para ter qualidade emocional e bem-estar. A melhor forma de ensinar é praticar regularmente. Se você faz, sente e integra em seu dia a dia, naturalmente você estimula e ensina quem está ao seu redor.
Meditação, mindfulness e respiração consciente são recursos sem custo, de fácil acesso que, depois de aprendidos e bem manejados, podem ser usados por todas as pessoas, de todas as profissões, idades e culturas. A atenção plena é uma forma de estar no mundo, pacífica, amorosa e agradável de se viver. Práticas de presença, de contato, de contato do olhar, de estar inteiro consigo e com o outro geram reconexão.
*Denise Tartarotti Postay é psicóloga clínica, especialista em traumas e saúde mental. Trabalhando com consultoria em projetos de promoção de saúde e mudança de cultura nas organizações, é uma das idealizadoras do Programa BIO Saúde Integral, Bem-estar e Qualidade de Vida.
- Complemente este conteúdo lendo: A arte do encontro