Gente dentro da gente
Se não aprendermos a cuidar da criança que mora em nós, ela vai transformar nossa vida em uma grande confusão
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Nesse mês de outubro, em que comemoramos o dia da criança, gostaria de trazer algumas reflexões sobre a nossa criança interior e “nossas” crianças feridas. Aspectos esses, que quando não conscientes, geram comportamentos inadequados e sintomas.
Nossa criança interior
Imagine que todas essas partes em nós, não se conhecem e tem diferentes opiniões sobre nossas escolhas e que, cada uma, quer determinar um caminho que a gente deve tomar. O fato de conhecermos muito pouco das “nossas” crianças feridas, nos leva a fazer escolhas inconscientes e acaba deixando nossa vida confusa.
Nossa criança interior, que também é uma criança divina, é curiosa, aventureira, aberta para o novo, movida pelo humor, pela alegria e pelo prazer. Esse aspecto de nós tem a inocência, a pureza, a beleza, a capacidade de confiar, o profundo desejo de se entregar para a vida como se fosse uma das brincadeiras mais divertidas. Ela é espontânea, aberta, criativa e tem capacidade de sonhar.
Você lembra da criança que foi um dia? Onde ela está? Quando foi que você parou de cantar, de sonhar, de dançar?
Lembro que, quando criança, eu queria muito que o mundo fosse melhor; sentia o mundo muito sofrido, pobre e violento. Queria crescer, ser rica e dar melhores condições de vida para minha mãe. Sonhava em ter uma casa melhor, carro, dinheiro. Venho de uma família pobre não só financeira, mas de espírito também. Imigrantes alemães que tiveram muitas perdas no caminho e muitas dificuldades para ter o básico.
O mundo era mágico para mim. Falava com as árvores, meditava nos seus galhos e, muitas vezes, dormia no balanço dos seus galhos e do vento. A noite era bem difícil, mas meu anjo da guarda estava sempre ali. Conversava comigo e me acalmava. O terror da noite era muito assustador, me deixava insone. Nessas horas ficava olhando para as estrelas, da janela do meu quarto e pensava de qual estrela eu tinha vindo. Sim eu acreditava que vinha das estrelas, de outro mundo de tão diferente que me sentia.
Eu queria saber de tudo, lia muito. Aos 10 anos já tinha lido todos os livros da biblioteca da minha escola. Isso ampliou ainda mais minha imaginação, meus sonhos e fantasias.
Em algum momento tudo se foi. Aí vem a pergunta: Por que será que perdemos a magia da vida? Para onde ela vai?
A magia da vida
Bom, hoje posso dizer ela está aqui, dentro de nós, mas devido às nossas dores, às estratégias de sobrevivência que criamos, ela fica anestesiada, escondida, assustada, com medo de se abrir, de se mostrar. Só que ela atua em nós de formas que não percebemos. Ela não fica quietinha, não se iluda. Ela cria confusões na nossa vida, nos coloca em situações com as quais jamais imaginamos lidar. Se não aprendermos a cuidar e libertar a criança que mora em nós, ela vai transformar nossa vida em uma grande confusão, pode acreditar.
Nossa criança ferida precisa de cuidados, de um adulto que cuide dela, a escute, a olhe, que permita que ela expresse suas dores infantis e seja entendida, compreendida.
A criança em nós e fora de nós (nossos filhos, sobrinhos, neto, pacientes, filhos dos amigos) precisam de segurança, calor, uma boa nutrição, atenção, estímulos para crescer, companhia, carinho, brincadeiras, limites. Ela precisa que sejamos um bom pai e uma boa mãe para ela.
A psicoterapia é um dos caminhos que nos conduz a curar o vazio que está dentro de nós para que possamos ser um adulto feliz.
E agora, antes de finalizar, que tal dar um colinho para a criança dentro de você? Experimente! Feche seus olhos, veja na sua mente o rosto da sua criança, sinta as mãozinhas dela abraçando seu pescoço, puxe-a pertinho de você, dê-lhe um abraço e sussurre nos seus ouvidos: eu gosto tanto de você! Que bom que você nasceu! A partir de hoje vou cuidar de você, alimentar você melhor e te escutar. Jamais te abandonarei!
Você consegue sentir amor por ela? Consegue se dar conta do quanto ela era e é única e especial? E do quanto ela precisa de você?